O
primeiro filho nasceu de cesárea. Grávida, ela resolve lutar por um parto
normal. O marido não consegue entender. “Por que escolher um caminho tão
difícil? Que diferença faz?”, questiona. A parteira Ana Cristina Duarte escreve
uma carta emocionante para ajudar essa mãe a encontrar suas próprias respostas.
Se o meu
marido me perguntasse isso, eu diria…
Porque
esse é o meu último filho e eu preciso experimentar o que o meu corpo pode.
Quero sentir meu filho passando através da minha bacia, abrindo meus ossos,
fazendo-os quase quebrarem pela força dele dentro de mim. Quero sentir meu
filho descendo e encaixando a cabeça nas minhas entranhas, milímetro a
milímetro, como se estivéssemos dançando um tango emocionante, em que cada
passo fosse totalmente calculado para um resultado perfeito. Quero sentir
minhas mucosas cedendo espaço e esquentando a cada contração, quero sentir meu
filho saindo pelo mesmo lugar por onde entrou. Quero me sentir mais perto de
Deus ao ser capaz de produzir uma vida e colocá-la de forma segura neste mundo.
Quero
sentir meu útero se contraindo com força, porque sou mulher e me sinto muito
orgulhosa de poder gerar, gestar, parir e alimentar uma criança. Se eu não vim
ao mundo para isso, então não sei exatamente o que vim fazer aqui. Quero sentir
cada contração como se fosse o sopro de Deus direto para dentro do meu corpo,
fazendo todas as minhas células tremerem com a energia desse evento. Quero que
meu filho sinta cada uma dessas contrações como se fosse um abraço
forte que
dou nele, como se Deus pessoalmente o estivesse embalando.
Quero que
ele perceba que algo importante e grandioso está para acontecer na
vidinha
dele. Quero que confie em mim para o resto da vida como sendo aquela pessoa que
lhe deu a vida e o colocou em segurança para fora do finito espaço uterino.
Quero que confie nele mesmo para sempre e saiba que com esforço e perseverança
pode conseguir o que quiser. Quero que saiba que eu e ele juntos, com o apoio
do pai dele e a torcida do irmão, podemos tudo. Que não há limitação para a
nossa força.
Quero
provar a mim mesma que sou uma pessoa capaz, que meu corpo não é meu
inimigo.
Pelo contrário, é meu amigo, meu companheiro, meu templo e meu porto seguro.
Quero recuperar tudo o que perdi e o que me roubaram quando tive bebê pela
primeira vez. Quero me sentir poderosa, forte, vitoriosa, criativa, emotiva,
grande, bonita – durante o parto e para sempre.
Quero
que, se as intervenções forem necessárias, só o sejam porque eu fiz tudo o que
estava ao meu alcance para evitá-las. Quero que meu filho nasça livre de
drogas, e que assim permaneça por toda a vida. Para que possa sempre sentir a
beleza da vida de cara limpa, de pele limpa, de olhos limpos. Quero que ele se
sinta calmo e seguro por estar sempre nos braços meus ou seus, ouvindo minha
voz ou a sua, e não fique sozinho chorando num berço aquecido, sem um único som
familiar para se acalmar.
Quero que
meu filho nasça e venha imediatamente para o meu colo, os meus braços, os meus
lábios, as minhas mãos, os meus peitos. E para isso preciso ter um parto
natural. Quero que meu filho nasça em paz, sem dor, sem ser arrancado das
minhas entranhas porque eu não me esforcei o suficiente.
Quero me
sentir mais capaz quando tudo isso terminar. Uma bruxa, uma deusa, uma
sacerdotisa do meu templo particular. Quero sentir minhas entranhas se abrirem
e desabrocharem dando uma vida nova a essa criança. Quero sentir a dor, a
ardência, o tremor, o prazer e a glória de parir. Quero me sentir mulher."
Ana
Cristina Duarte é obstetriz pela USP Leste e coordenadora do Gama (Grupo de Apoio à Maternidade
Ativa), em São
Paulo
http://fisioedoulamariahcoeli.blogspot.com.br/2013/07/por-que-lutar-por-um-parto-normal.html
Nenhum comentário:
Postar um comentário