Em trabalho de parto e prestes a dar à luz, a dona de casa Rivania Rosa
da Silva ouviu do obstetra a notícia de que o filho, Vinícius, estava
entrando em sofrimento fetal e poderia morrer. Uma cesárea foi feita e o
primogênito nasceu saudável, mas Rivania se desesperou.
— Comecei a sofrer ataques de pânico, depressão e ansiedade. Tive
depressão pós-parto, precisei de tratamento psiquiátrico e psicológico. E
não tinha sofrimento fetal nenhum. Era mentira.
Hoje, Rivania sequer acredita que a cesárea fosse mesmo necessária, e
na segunda gestação preferiu procurar uma alternativa à realidade de
muitos hospitais brasileiros: um indíce de cesáreas muito superior ao
indicado pela Organização Mundial de Saúde.
— Para mim, o parto domiciliar é o melhor parto. Sou saudável, tive uma
gravidez de baixo risco, e minha casa é o lugar onde me sinto mais
segura, confortável e tranquila.
Rivania buscou uma equipe especializada em parto em casa e fez todos os
exames necessários para garantir que ela e o bebê estavam em perfeitas
condições de saúde. O momento em que Raul veio ao mundo superou as
expectativas da mãe de segunda viagem.
— Durante meu trabalho de parto me senti forte e segura. Hoje me sinto realizada e feliz.
Como é o parto em casa
Dar à luz em casa foi a opção de famosas como Carolinie Figueiredo, que
teve o caçula Theo no banheiro, e de Gisele Bündchen, que deu à luz
Benjamin e Vivian em uma banheira. Se antes ele era a alternativa que
restava a mulheres de pouca renda e de áreas rurais, agora é a escolha
de quem tem à disposição também as cesáreas em hospitais.
De acordo com a enfermeira obstetra Joyce Koettker, membro da Equipe
Hanami de parto domiciliar planejado, dar à luz em casa nada tem a ver
com as cenas trágicas e cheias de sofrimento mostradas em filmes e
novelas. Ela explica que a gestante é preparada e aconselhada durante
toda a gravidez, para que no momento do parto não fique tensa nem
insegura.
— O atendimento começa no primeiro contato. Até o bebê nascer são
diversas conversas e atividades gratuitas para conhecer histórias de
parto natural, cesáreas, bebês que ficaram na UTI neonatal e outros
casos.
A futura mamãe deve fazer também um curso preparatório e o pré-natal
tradicional. Joyce explica que é necessário saber se não há nenhuma
doença associada, se é um bebê só, se está virado de cabeça para baixo e
se a gestação é toda tranquila.
A partir da 37º semana uma enfermeira da equipe vai semanalmente na
casa da gestante para fazer exames e verificar a pressão arterial.
— Trabalhamos também aspectos emocionais que podem influenciar na hora
do parto. Se a gestação é difícil, não foi planejada, tem medo da dor,
histórico de violência na família.
Quando a gestante sente que está em trabalho de parto, liga para uma
das enfermeiras do grupo, que corre para a casa da família. As demais
profissionais da equipe só chegam quando o trabalho de parto está
evoluído.
Enquanto o bebê não vem, a mãe pode caminhar, ir ao banheiro, comer, se hidratar e receber uma massagem.
— Quando começa a aparecer o cabelinho do bebê, ela se prepara para o
parto. Nós trabalhamos com a saída lenta da criança, então não mandamos
fazer força.
Depois da chegada do bebê ao mundo, fica algum tempo no colo dos pais e
passa por exames físicos e neurológicos. A mãe ainda recebe ajuda na
saída da placenta e no controle do sangramento, quando necessário.
— Após o parto ainda ficamos cerca de três horas na casa.
Dar à luz em casa é seguro?
Em 2012, uma australiana morreu após ter seu segundo bebê em casa.
Caroline Lovell era uma defensora do direito ao parto domiciliar, e
chegou a ser transferida a um hospital, mas morreu no dia seguinte à
internação. Desde então nenhum outro caso semelhante ganhou o mundo.
De acordo com o obstetra Sergio Luz, membro da Federação Brasileira da
Associações de Ginecologia e Obstetrícia, o parto pode ser natural e em
casa, se a mãe optar pelo acompanhamento de profissionais que trabalhem
dessa maneira. Ele acredita que a escolha do melhor lugar a dar à luz
cabe à mulher.
Mas há alguns requisitos a atender.
— É necessário que ela seja classificada como baixo risco, para que não
tenha complicações severas e nem no desenvolvimento do bebê no útero. E
a grande maioria das mulheres no Brasil teria condições de ter parto em
casa.
Luz considera importante ter um hospital como opção, para o caso de
emergências. E cabe à equipe cuidar dessa questão e orientar a mãe sobre
isso.
O médico afirma que no parto domiciliar existe um risco para o bebê,
mesmo que a saúde pareça perfeita no pré-natal. Mas ele é mínimo.
— Existe um pouquinho mais de risco para o recém-nascido. É pequeno,
quase desprezível, mas existe. Se ele nascer um pouco doente e precisar
de atendimento hospitalar, cada minuto é importante.
Estatísticas do nascimento
A Organização Mundial de Saúde recomenda que, em cada país, apenas 15%
dos nascimentos seja por cesárea - somente quando a cirurgia é
inevitável. Entretanto, no Brasil, essa taxa chega a 43% ao ano. Na rede
privada, o índice é de 82%.
Os motivos para esse índice elevado de cesáreas, de acordo com Luz, vão
desde uma ideia errônea de que parto normal é para quem não tem
dinheiro para uma operação, até o desejo de fazer o filho nascer no dia
do aniversário do pai, por exemplo. A necessidade de muitos obstetras de
organizar a agenda e não perder muito tempo com cada parto é outro
fator a influenciar esses números.
As condições do parto no Brasil também preocupam. Em uma pesquisa feita
pela Fundação Perseu Abramo, 25% das entrevistadas relatou ter sofrido
algum tipo de violência na hora de dar à luz. Enquanto algumas relataram
falta de auxílio da equipe médica, outras foram agredidas verbal,
física e até sexualmente por enfermeiros e médicos.
Não existe lugar certo para parir
Com aversão a médicos, remédios e hospitais, a jornalista e fotógrafa Kalu Brum se descobriu, em 2006, grávida.
— Só sabia que não queria nenhum tipo de medicamento no meu corpo.
Começou a pensar em um parto natural, mas sem saber que existia de
verdade e que tinha esse nome. E depois de muitas pesquisas e contatos, a
moradora de São Paulo chegou a um hospital referência em parto normal
natural e que presta atendimento pelo Sistema Único de Saúde.
— Cheguei e fiquei encantada. Me surpreendi com a casa de parto. Tudo
tão tranquilo e lindo! A casa de parto em questão faz parte do
Hospital Sofia Feldman, de Belo Horizonte, Minas Gerais. Lá, Kalu
descobriu que seria possível dar à luz em casa. Mudou-se para a cidade e
se preparou para esse momento, tão feliz e satisfatório que, por causa
dele, a fotógrafa se aprofundou no assunto e hoje é doula e voluntária
em um centro de apoio para gestantes.
Quando atende uma mãe, Kalu reúne informações científicas para possibilitar que ela tome a decisão que achar melhor.
— Não existe melhor lugar para parir. Tendo uma boa equipe é possível
ter um parto sensacional numa maternidade. A escolha do lugar é onde a
mulher se sente segura, e o que procuro mostrar é que muitas vezes os
medos são infundados, que o parto é algo simples e fisiológico que
poderia acontecer com segurança, como apontam as evidências, em 85% dos
casos em casa.
Fonte: http://entretenimento.r7.com/casa-e-familia/fora-da-maternidade-maes-escolhem-dar-a-luz-em-casa-17032014
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